Ana Rita de Calazans Perine
3 min readFeb 22, 2020

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CARNAVAIS...

Nessa época do ano, como de costume, a turma se divide entre os que gostam e os que não gostam de carnaval. Quem dera fosse essa nossa única divisão... O lúdico faz falta na vida da gente! Onda que se propaga consciente de sua fala, ecoa de forma leve e aglutinadora na força do grupo. A utopia marca presença, injeta ânimo, preserva e impulsiona sonhos... Então vai, brinca, brilha! Se quiser ou não puder, fica! Mas não deixe de perceber que é parte de nossa cultura que sai as ruas, avenidas e salões... E o melhor dela todos trazemos dentro. Quem, na infância, não teve um caso de amor com confetes e serpentinas?!

Pequenos, aqui em Gramado, nos carnavais infantis da Recreio e da Minuano, infinitamente mais do que a fantasia que vestíamos ou a marchinha que tocava, nos divertíamos reabastecendo os sacos de confetes com os já depositados no chão dos salões, depois de freneticamente arremessados por nós mesmos em mais uma épica batalha. Todos em conjunto tratávamos de juntar as munições, os confetes derradeiros eram solidariamente coletivizados, sem o espírito de equipe a coisa não rendia, perdia a graça... Conflitos havia, logo gerenciados, quando punhados de confetes atingiam olhos e boca, engoli muitos... Mãos companheiras iam e vinham, a depender do horário e do clube, mas a brincadeira era a mesma, conduzida até a exaustão. Não era raro a Banda cair no cansaço antes da gente. Daí vinha o melhor, salão vazio e a gente deslizando sobre os confetes... Quando finalmente nos dávamos por vencidos, completamente desgrenhados e com confetes grudados até onde não alcançava o pensamento, vinha a fase da “escabiose”, coçava tudo e tanto que até mesmo os não tão afeitos dariam suas guloseimas em troca de um bom banho...

Os anos passaram, junto as marchinhas e sambas tradicionais, sempre na ponta da língua, novas letras e novos ritmos... O crivo da escolha: beleza, veracidade e poesia. Assim passei pelos Municipais de Gramado, ao som de Bandeira Branca e outros clássicos, pelas ruas de Salvador, onde esperava passar Filhos de Gandhi e Ilê Aiyê, pelas janelas elétricas e ladeiras de Ouro Preto, atrás da Bandalheira... Mas foi no Carnaval sadio, divertido e politizado de BH, que a mescla ritualizada de Afoxé e Ijexá conquistou definitivamente meu coração. A bandeira da paz solta a voz das causas necessárias e junta foliões que deslizam em um vibrante cortejo azul. Assim é o Pena de Pavão de Krishna, com incensos, flores, mantras e piqueniques. Sem grandes equipamentos de som, mas com uma energia que contagia tanto, que me faz sentir junto, mesmo distante.

O carnaval cumpre com a função de nos lembrar que, em meio a transitoriedade dos ciclos e o mascarar dos dias, somos todos gente: viva, com voz e vez! Meus melhores carnavais foram assim: comuns, mágicos, coletivos, sagrados e catárticos. Eles me fizeram desdobrar em mim mesma, fazer girar a roda da vida e terminaram em verdadeiras e doces cirandas...

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Ana Rita de Calazans Perine

Filósofa Clínica, Pesquisadora, Educadora, Mobilizadora Social e Empresarial / Instituto ORIOR — Resgate Filosófico, Transdisciplinaridade e Sustentabilidade.